
O ano de 2025 mostra já ser um novo marco na dimensão de milhares de hectares de devastação pelos incêndios florestais, no país. Investigadores, ambientalistas, associações, coletivos e outros cidadãos, alertam novamente, através da Aliança pela Floresta Autóctone, para um pacto nacional para as áreas florestais.
Quando o Governo anuncia um pacto pela floresta a 25 anos, até 2050, a Aliança pela Floresta Autóctone, que tem vindo a propor esse pacto, alerta, no entanto, para o papel positivo das autóctones e negativo de certas pirófilas que são amigas do fogo, como o eucalipto e o pinheiro-bravo.
A posição da Aliança pela Floresta Autóctone indicou ter em conta sobretudo os seguintes aspetos:
“1 – Grande parte do país, sobretudo as regiões mais atingidas, sentem-se tomadas pelo desespero, e com toda a razão. Há quem aponte como solução que se prendam mais incendiários. Certamente que há incendiários, e por isso existe uma dimensão judicial associada. Mas não são os incendiários que explicam a dimensão, a severidade e a gravidade dos incêndios a que temos assistido, nomeadamente nos últimos anos. A causa profunda desses incêndios não vai a tribunal nem irá para a cadeia, pois reside no caos do coberto arbóreo que se instalou no país ao longo já de muitas décadas. Mas, acima de tudo, há que responsabilizar os que lucram com este caos e os diversos governos que nada de fundamental fizeram para reverter este cenário, ou que continuam a pactuar com políticas de proliferação de vastas áreas de espécies como o eucalipto e o pinheiro-bravo. Ainda a referir que, a gestão dos espaços florestais por entidades sem vocação para o fazer, como as autarquias, recorrendo frequentemente a práticas de corte raso, sem acompanhamento posterior, leva à proliferação de espécies exóticas oportunistas que se espalham rapidamente e que são muitíssimo inflamáveis, como é o caso das acácias.
2 – O caos atrás referido revela um outro aspeto essencial quando se sobrepõem os mapas da maior gravidade dos incêndios no país e o mapa do chamado interior, caracterizado pela sua baixa densidade populacional. Atendendo à coincidência destes dois mapas, precisamos de um modelo de gestão racional dos recursos, que faça convergir a alteração das espécies arbóreas mais problemáticas em relação ao fogo por espécies autóctones, a promoção de áreas destinadas à agricultura de elevado valor alimentar e ambiental e o incentivo da pastorícia como forma de controlo natural da vegetação. Desta maneira, se formam ou reconstituem ecossistemas autóctones e biodiversos, num mosaico que interrompa e introduza a descontinuidade da matéria vegetal facilmente inflamável. Se assim não for, a gravidade dos incêndios manter-se-á mesmo que se prendam muitos incendiários.
3 – Para isso, é preciso, a curto, médio e a longo prazo, incentivar e apoiar decididamente a retirada de manchas arbóreas de espécies pirófilas atrás referenciadas, e plantar aí, gradual e progressivamente, segundo um plano cuidadoso e persistente, árvores autóctones,fundamentalmente carvalhos, azinheiras e sobreiros e espécies associadas. É necessário criar ou recriar economias em conexão com estas florestas de Quercus, que podem ser complementadas com outras espécies, como a nogueira e o castanheiro.
4 – As áreas ocupadas por espécies pirófilas, como o eucalipto e o pinheiro-bravo, devem diminuir de dimensão e ficar sujeitas a regras exigentes de ordenamento da paisagem e a taxas ambientais adequadas, dando lugar a vastas áreas envolventes de descontinuidade de matéria vegetal inflamável.
5 – Numa fase de transição, e no que se refere ao combate aos incêndios e uso dos respetivos meios, cuja expressão atual deveria ser vista como exceção, será ainda necessário agir de forma que as autoridades, de modo coordenado e eficiente, apostem, com continuidade e persistência, nas ações apontadas nos quatro primeiros pontos. Tal permitirá uma progressiva diminuição do papel do combate e respetivos meios, em vez de uma escalada em crescendo, que hoje predomina. Deve privilegiar-se a prevenção, o que irá naturalmente diminuir a fatura do combate e o perigo associado aos grandes incêndios florestais (de modo equívoco, e desde há poucos anos, também chamados de incêndios rurais).”
A Aliança pela Floresta Autóctone lembra que os incêndios deste ano mostraram, mais uma vez, a importância das folhosas autóctones, como os carvalhos, como espécies mais resistentes ao fogo. Um exemplo é o da Aldeia de Cerdeira, na Lousã, que sobreviveu devido à presença destas folhosas, fruto de um esforço coletivo já com 25 anos de existência, enquanto, na sua envolvente, as monoculturas ardiam com imensa intensidade.
Outro dos exemplos foi o da Mata da Margaraça, uma relíquia florestal. No entanto, a Aliança dá nota que a Mata da Margaraça já se encontre “cada vez mais ameaçada pelo mar da monocultura circundante“.
Estes são exemplos que evidenciam que é possível e é necessário preparar um território mais resistente e resiliente aos fogos e ao mesmo tempo capaz de mitigar as alterações climáticas e a perda da biodiversidade. Para isso Aliança pela Floresta Autóctone referiu ser preciso “reintroduzir o equilíbrio ao sistema altamente alterado e desajustado às condições do território, que por esse facto se autoconsole periodicamente.”
Para a Aliança pela Floresta Autóctone “é um imperativo ético diminuir o risco associado aos fogos, que consomem vidas humanas, recursos e infraestruturas, e uma imensidão de vidas não humanas e de ecossistemas, também eles de valor incalculável, não só instrumental, mas também intrínseco.”













