Resistência a antibióticos e a situação na União Europeia

A resistência aos antibióticos é atualmente a causa de morte de 25 mil pessoas por ano na União Europeia, mas dentro de poucos anos poderá matar mais que o cancro. Mas quais são as causas e como pode a situação ser modificada?

Antibióticos
Antibióticos. Foto: Rosa Pinto

A Comissão Europeia lançou hoje, 29 de junho, um novo plano para combater a resistência aos agentes antimicrobianos, os designados antibióticos. Neste novo plano a Comissão pretende envolver todos os cidadãos europeus para que o mesmo tenha sucesso.

A Comissão elaborou um conjunto de questões e respetivas respostas para um melhor conhecimento sobre os problemas ligados à resistência aos antibióticos, a atual situação e vantagens e dificuldades do novo Plano de ação ‘Uma Só Saúde’.

Qual é a causa da crescente resistência aos agentes antimicrobianos na União Europeia?

O aumento da resistência aos agentes antimicrobianos deve-se a vários fatores, entre os quais a utilização excessiva e inadequada de antibióticos nos seres humanos, o uso veterinário excessivo na produção animal e a falta de condições de higiene em contextos de prestação de cuidados de saúde ou na cadeia alimentar.

A falta de sensibilização também continua a ser um fator fundamental, dado que 57 % dos europeus não sabem que os antibióticos são ineficazes contra os vírus, 44 % não sabem que são ineficazes contra as constipações e a gripe, como indicam os dados do Eurobarómetro de junho de 2016.

Qual é a dimensão do desafio da resistência aos agentes antimicrobianos na União Europeia e a nível mundial?

Segundo as estimativas, a resistência aos agentes antimicrobianos causa 25 000 mortes por ano e 1,5 mil milhões de euros em custos adicionais de cuidados de saúde anuais, só na União Europeia. As infeções resistentes a terapias multimedicamentosas e tratamentos de último recurso têm aumentado de forma significativa nos últimos anos na Europa.

A nível mundial, estima-se que morram 700 mil pessoas por ano devido a infeções resistentes aos antibióticos, e o Banco Mundial alertou para o facto de que, até 2050, as infeções resistentes aos medicamentos podem causar danos económicos a nível mundial idênticos aos da crise financeira de 2008. Segundo as projeções, a falta de uma ação neste domínio causará milhões de mortes a nível mundial todos os anos e em 2050 a resistência aos agentes antimicrobianos poderá tornar-se uma causa de morte mais comum do que o cancro.

O que se conseguiu com o primeiro Plano de Ação de 2011 a 2016?

O primeiro plano de ação serviu como um símbolo do empenhamento político e incentivou a ação nos países da União Europeia. Assim, por exemplo, muitos países adotaram planos de ação nacionais com atividades relacionadas com a utilização prudente dos agentes antimicrobianos, a vigilância da resistência aos agentes antimicrobianos e a vigilância da utilização de agentes antimicrobianos.

No que diz respeito ao setor animal, em 2015 a Comissão adotou propostas legislativas sobre medicamentos veterinários e alimentos medicamentosos para animais, ambos extremamente importantes na luta contra a resistência aos agentes antimicrobianos. Essas propostas estão atualmente em discussão no Parlamento Europeu e no Conselho, tendo em vista a adoção de regulamentos vinculativos da União Europeia em 2018.

Desde 1999, a União Europeia já gastou mais de 1,3 mil milhões de euros em investigação colaborativa transnacional sobre a resistência aos agentes antimicrobianos para garantir que os agentes antimicrobianos sejam utilizados adequadamente. Os projetos e investigações financiados pela União Europeia estudam o modo como a resistência aos agentes antimicrobianos se desenvolve e transmite e apoiam o desenvolvimento de testes rápidos de diagnóstico, de novos tratamentos antimicrobianos e medidas alternativas, como as vacinas, e de estratégias para uma utilização responsável dos antibióticos em todos os domínios.

Como reação ao primeiro plano de ação, foi lançada em maio de 2012 a maior parceria público-privada do mundo, o programa New Drugs for Bad Bugs, no quadro da Iniciativa sobre Medicamentos Inovadores. Através deste programa, os parceiros do setor académico e outros parceiros públicos e as empresas farmacêuticas unem esforços a fim de promover o desenvolvimento de novos antibióticos, com um orçamento total de cerca de 700 milhões de euros. Foi igualmente estabelecida a iniciativa de programação conjunta sobre a resistência aos agentes antimicrobianos, tendo como objetivo integrar os esforços de investigação para além das fronteiras nacionais mediante o alinhamento e o financiamento da investigação, bem como criar uma agenda de investigação comum. A JPI AMR engloba atualmente 23 países.

O que há de novo no Plano de Ação adotado hoje?

O novo plano de ação estabelece um enquadramento abrangente para uma ação mais alargada com vista a reduzir o surgimento e a propagação de resistência aos agentes antimicrobianos e reforçar o desenvolvimento e a disponibilidade de novos agentes antimicrobianos eficazes, dentro e fora da União Europeia.

O plano centra-se em atividades com um claro valor acrescentado da União Europeia e, sempre que possível, em resultados mensuráveis e concretos. Ao mesmo tempo que assegura o prosseguimento das ações da União Europeia que ainda são necessárias, o novo plano de ação irá reforçar o seu apoio para ajudar os países da UE a encontrar respostas inovadoras, eficazes e sustentáveis no domínio da resistência aos agentes antimicrobianos. Visa, por exemplo, intensificar os esforços de colaboração e de vigilância para reduzir as lacunas de dados e criar mais sinergias e uma maior coerência entre as diferentes políticas, de acordo com a abordagem ‘Uma só saúde’.

De que modo irá o novo Plano de Ação tornar a União Europeia numa ‘região de boas práticas’?

Existem diferenças significativas entre os países da União Europeia no que diz respeito à utilização de agentes antimicrobianos, à ocorrência de resistência e ao grau de aplicação de políticas nacionais eficazes de luta contra a resistência aos agentes antimicrobianos. Com a adoção do novo plano de ação, a Comissão pretende reduzir essas diferenças e contribuir para que todos os Estados-Membros da União Europeia atinjam o nível do país com melhores resultados.

Para se atingirem os níveis, e dentro dos limites das competências da União Europeia, as ações irão centrar-se nos domínios com o maior valor acrescentado para Estados-Membros específicos, como, por exemplo, a promoção da utilização prudente dos agentes antimicrobianos, o reforço da coordenação e da aplicação das regras da União Europeia existentes, a melhoria da prevenção de infeções e o alargamento da vigilância da resistência aos agentes antimicrobianos e do consumo de agentes antimicrobianos.

Em que objetivos se centrará o pilar de investigação do plano?

As ações no âmbito do pilar de investigação destinam-se a estimular a investigação e incentivar a inovação, dar um contributo valioso para a adoção de políticas cientificamente fundamentadas e medidas legais de combate à resistência aos agentes antimicrobianos e colmatar as lacunas de conhecimentos, por exemplo sobre o papel da resistência aos agentes antimicrobianos no ambiente.

Utilizando diferentes instrumentos de financiamento e parcerias ao abrigo dos seus Programas-Quadro de Investigação e Inovação atuais e futuros, a Comissão assegurará que as iniciativas já estabelecidas, como a ND4BB e a JPIAMR, atinjam o seu pleno potencial, e apoiará ações em matéria de deteção, controlo e vigilância de infeções, novas terapêuticas e medidas alternativas, vacinas, meios de diagnóstico, novos modelos económicos e incentivos e, por último, mas não menos importante, ambiente e prevenção da transmissão.

Por que motivo a União Europeia está em boa posição para definir a agenda global?

Em primeiro lugar, a abordagem ‘Uma só saúde’ já foi reconhecida como constituindo a melhor prática a nível internacional, e muitas das políticas internas da União Europeia sobre a RAM, como a proibição do uso de agentes antimicrobianos como promotores de crescimento nos alimentos para animais produtores de alimentos, já contribuem para objetivos internacionais.

Em segundo lugar, ao ser um dos maiores mercados para os produtos agrícolas, a União Europeia pode desempenhar um papel de primeiro plano na promoção das suas normas relacionadas com a resistência aos agentes antimicrobianos, das sua medidas em matéria de produção alimentar e das suas normas sobre bem-estar dos animais, sobretudo através dos acordos bilaterais de comércio livre. A inclusão de disposições relativas à resistência aos agentes antimicrobianos em todos os novos acordos de comércio livre é agora uma prática corrente da Comissão.

Em terceiro lugar, foram já estabelecidas com êxito iniciativas de investigação de grande dimensão que vão além das fronteiras europeias, como a Parceria entre Países Europeus e em Desenvolvimento para a Realização de Ensaios Clínicos e a JPIAMR, pelo que a União Europeia está bem colocada para promover a colaboração e o alinhamento dos esforços e iniciativas de investigação sobre a resistência aos agentes antimicrobianos.

Por último, nos países menos desenvolvidos, onde a ameaça da resistência aos agentes antimicrobianos para a saúde pública e para a economia é ainda maior, a União Europeia pode continuar a contribuir para a sensibilização e a apoiar o reforço das capacidades e as políticas de combate à resistência aos agentes antimicrobianos, sempre que possível.

Quem foi consultado durante a elaboração do novo Plano de Ação?

Numa primeira etapa, de 24 de outubro de 2016 a 28 de março de 2017, as partes interessadas tiveram a oportunidade de apresentar as suas observações sobre um roteiro da Comissão relativo a um plano de ação ‘Uma Só Saúde’ contra a resistência aos agentes antimicrobianos.

Em seguida, de 27 de janeiro a 28 de abril de 2017 a Comissão procedeu a uma ampla consulta pública aberta sobre possíveis atividades a incluir no plano de ação. A consulta foi dirigida aos cidadãos e partes interessadas com interesse nos domínios da política de saúde animal e humana, da saúde animal, da saúde pública, dos cuidados de saúde e/ou do ambiente na Europa.

Participaram na consulta 421 cidadãos de 22 países da União Europeia, bem como alguns cidadãos de países terceiros, para além das 163 partes interessadas que representavam administrações públicas ou privadas, ONG, a indústria farmacêutica e os prestadores de cuidados de saúde.

De que modo irá a Comissão avaliar o êxito?

Uma das ações consiste em determinar um número limitado de indicadores-chave de resultados, com base nos dados já recolhidos, de modo a que os sistemas da União Europeia possam medir os progressos da União Europeia e dos Estados-Membros.

Os indicadores serão desenvolvidos com o apoio das agências científicas da União Europeia. Permitirão aos Estados-Membros avaliar os progressos realizados na execução dos seus planos de ação nacionais ‘Uma Só Saúde’, ajudando-os a definir metas mensuráveis para a redução da resistência aos agentes antimicrobianos nos seres humanos e nos animais produtores de alimentos e a melhoria da utilização adequada dos agentes antimicrobianos em ambos os setores.

Os progressos serão debatidos periodicamente na rede ‘Uma Só Saúde’ para a resistência aos agentes antimicrobianos, para orientar os Estados-Membros e determinar se são necessárias novas ações ao nível da União Europeia.