A proteína Survivina que desempenha papéis-chave na regulação da divisão celular e na inibição da apoptose, a morte celular programada, tem uma função importante na iniciação e formação de um carcinoma basocelular, o cancro da pele humano mais comum.
A descoberta foi feita uma equipa internacional de investigadores, coliderada por Adriana Sánchez-Danés, investigadora principal do Laboratório de Biologia do Cancro e Células-Tronco da Fundação Champalimaud, em Lisboa, e por Cédric Blanplain, da Université Libre de Bruxelles, os resultados da investigação que levaram à descoberta já foram publicados na edição impressa de 8 de janeiro de 2025, da revista “Cell Discovery”.
“O carcinoma basocelular é de longe o cancro da pele mais comum em humanos”, disse Adriana Sánchez-Danés, citada em comunicado da Fundação, e acrescentou: “Todos nós conhecemos pessoas que tiveram um, se não nós mesmos.”
O carcinoma basocelular raramente metastatiza e geralmente é tratado por cirurgia simples, mas também pode, em alguns casos, se tornar metastático ou localmente muito agressivo, e é. “por isso que é tão importante entender os diferentes estágios e passos que levam à formação, bem como à progressão desta doença”, esclareceu a investigadora.
Os dois investigadores Adriana Sánchez-Danés e Cédric Blanplain já, em 2016, publicaram os resultados de investigação, na revista “Nature”, em que mostravam as células-tronco da pele dão origem ao carcinoma basocelular, mas não as células progenitoras, que são as descendentes imediatas das células-tronco.
Nesta nova investigação os investigadores analisaram mais profundamente o que está na raiz dessa diferença entre as células para potenciar a iniciação do cancro. Adriana Sánchez-Danés esclareceu: “A nova questão era: quais são os mecanismos que estão a mediar a competência para a iniciação do cancro nas células-tronco, mas não nas células progenitoras? Existem mecanismos específicos nas células-tronco que as tornam competentes?”.
Para encontrar uma explicação para a questão, os investigadores começaram por realizar, em modelos animais, um chamado perfil transcricional de células-tronco da pele que expressam oncogenes e células progenitoras da pele. Um processo que consistiu em comparar os genes expressos em células-tronco e progenitoras da pele do rato que tiveram os oncogenes (genes causadores de cancro) ativados. Os investigadores identificaram vários genes que foram regulados positivamente (superexpressos) nas células-tronco ativadas, o que permitiu chegar à Survivina, que também é conhecida como BIRC5. “A survivina foi o único gene que realmente atraiu nossa atenção“, disse Adriana Sánchez-Danés.
Mecanismos de iniciação e progressão do carcinoma basocelular
O gene BIRC5 é altamente expresso na maioria dos cancros humanos, como no cancro do pulmão, pâncreas e mama, em relação aos tecidos normais; é um gene antiapoptótico (pró-sobrevivência) que desempenha um papel fundamental durante a divisão celular.
A questão seguinte colocada pelos investigadores foi a de querer “entender se a expressão Survivina nas células-tronco ativadas estava a desencadear a sobrevivência das células e a aumentar a proliferação, resultando em carcinoma basocelular”.
Para determinar se a Survivina realmente desempenha um papel na iniciação do carcinoma basocelular – e formação – em células-tronco, os investigadores decidiram suprir o gene nos modelos genéticos de ratos após a ativação dos genes causadores de cancro. Um processo que tinha como base a hipótese de que, se a Survivina fosse necessária para a formação do tumor, sua supressão tornaria as células-tronco incapazes de gerar um tumor. Uma hipótese que foi confirmada.
A questão seguinte foi a de se a superexpressão do gene BIRC5 tornaria as células progenitoras também capazes de iniciar um tumor? Para encontrar a resposta os investigadores criaram “um novo modelo genético de camundongo que permitiu superexpressar Survivina”. O que efetivamente tornou as células progenitoras capazes de fazer tumores de carcinoma basocelular. A superexpressão de Survivina desencadeou a proliferação nesses progenitores e, ao mesmo tempo, impediu a apoptose e a diferenciação, levando à formação de cancro.
Por outro lado, os pesquisadores também descobriram que a inibição da Survivina em lesões pré-neoplásicas, usando inibidores da Survivina, impediu a conversão em tumores invasivos. “Isso mostrou que a Survivina é necessária não apenas para o início e a formação de lesões pré-neoplásicas, mas também para sua conversão de pré-neoplásica em cancro invasivo”, explicou a investigadora.
“Foi demonstrado que a survivina é regulada positivamente em muitos tumores humanos e é importante para o crescimento e manutenção do tumor. Mas esta é a primeira vez que seu papel na iniciação do tumor é descrito”, releva Adriana Sánchez-Danés. “Além disso, descobrir que ela (survivina) é necessária para a conversão de lesões pré-neoplásicas em tumores invasivos é relevante, pois pode ser explorada terapeuticamente.”
Potencial terapêutico da descoberta
Para os investigadores os resultados têm potenciais implicações terapêuticas, pois vários inibidores de Survivina já foram desenvolvidos e estão atualmente a ser testados em ensaios clínicos. Assim, o artigo refere: “Os nossos dados também mostram que a administração de curto prazo de um inibidor de Survivina leva à redução e eliminação de lesões pré-neoplásicas e previne a progressão do carcinoma basocelular”.
No entanto, o inibidor de Survivina que os investigadores usaram era um pouco tóxico para os animais, o que como referiu a investigadora, “levou a encontrar uma estratégia alternativa”, que “em vez de usar um inibidor de Survivina, usamos um inibidor de uma proteína chamada “quinase 1 regulada por soro e glicocorticoide” (SGK1), que também impediu que lesões pré-neoplásicas avançassem para um tumor.”
Recentemente foram desenvolvidos e descritos vários inibidores de SGK1 para levar à redução do tumor, quer sozinhos ou em combinação com outras opções de tratamento em uma variedade de tipos de tumores, como referem no artigo os investigadores, e acrescentam: “Os nossos dados mostram que a inibição de SGK1 pode prevenir a conversão de lesões pré-neoplásicas em tumores invasivos, representando uma alternativa ao uso de inibidores de Survivina na prevenção da progressão do carcinoma basocelular.”
Com indicado pelos investigadores, ambas as estratégias poderiam, em princípio, ser usadas em humanos, porque os inibidores de Survivina poderiam ser aplicados como um creme na pele e, portanto, teriam menos efeitos colaterais do que a administração sistémica de um medicamento, como foi o caso no estudo com os modelos experimentais de ratos.
“O nosso principal resultado é que a Survivina pode ajudar-nos, no futuro, a prevenir a geração de carcinomas basocelulares invasivos”, afirmou Adriana Sánchez-Danés.
A Investigadora acrescentou: “Para mim, a parte mais bonita do nosso estudo foi descobrir que a Survivina também pode induzir células resistentes à formação de cancro a tornarem-se competentes nesse aspeto”, e conclui: “Essa é uma mensagem muito forte. Não tínhamos a certeza se seria o caso quando iniciamos o projeto, mas acabou a ser verdade. Foi uma descoberta emocionante.”