Tratamento de leucemia pode melhorar com medicamento para excesso de ferro

Quimioterapia no tratamento de leucemia mieloide aguda pode ser mais eficaz com recurso a medicamento para excesso de ferro. A descoberta feita no Imperial College London envolveu o médico e investigador português Delfim Duarte.

Medula óssea saudável (amarela) invadida por leucemia, com vasos sanguíneos em ciano (vermelho).
Medula óssea saudável (amarela) invadida por leucemia, com vasos sanguíneos em ciano (vermelho). ©Delfim Duarte/Imperial College London

A Leucemia Mieloide Aguda (LMA) é um cancro agressivo que impede a produção de células sanguíneas saudáveis. A quimioterapia é o tratamento padrão, mas são necessárias melhorias, uma vez que a taxa de sobrevivência para pacientes com mais de 60 anos é de apenas de 5 a 15%, para cinco anos.

Delfim Duarte, médico de hematologia no Instituto Português de Oncologia do Porto e investigador no Imperial College London
Delfim Duarte, médico de hematologia no Instituto Português de Oncologia do Porto e investigador no Imperial College London. Foto: DR

Agora, ao estudar como as células de leucemia se infiltram na medula óssea, onde as células do sangue são criadas, uma equipa de investigadores do Imperial College London fez uma descoberta crucial. Delfim Duarte, médico de hematologia no Instituto Português de Oncologia do Porto (IPO-Porto) e investigador de pós-doutoramento no Imperial College London, realizou a maior parte das experiências de investigação.

O estudo em ratos e amostras humanas permitiu descobrir que certas áreas da medula óssea suportam células estaminais do sangue, que quando são atingidas por células leucémicas, são afetadas e a produção de sangue saudável é significativamente reduzida. Uma condição que pode causar anemia, infeção e derrame de sangue nos pacientes, e afeta o sucesso da quimioterapia.

A equipa de investigadores também descobriu que um medicamento já aprovado para tratar uma condição conhecida como excesso de ferro pode proteger essas importantes áreas de medula óssea e permitir que as células estaminais do sangue sobrevivam. Seus resultados do estudo já se encontram publicados na revista Cell Stem Cell.

Cristina Lo Celso, do Departamento de Ciências da Vida do Imperial College London, e líder do estudo, referiu: “Uma vez que o medicamento já está aprovada para uso humano para uma condição diferente, já sabemos que é seguro, pelo que “precisamos testá-lo no contexto de leucemia e quimioterapia, mas, como já está em uso, podemos progredir para ensaios clínicos muito mais rápido do que se fosse um novo medicamento”.

Os investigadores estão agora a reunir-se com clínicos para dar início a ensaios em pacientes que sofrem de LMA. Para compreender se este medicamento é uma opção viável deve levar menos de cinco anos, muito menos dos 10 a 15 anos necessários quando se trata de desenvolver um medicamento totalmente novo.

A equipa registou em vídeo a invasão de células de leucemia na medula óssea em ratos. Esta abordagem permitiu ter uma visão geral e detalhes ‘incríveis’ da medula óssea, que revelaram fenómenos a acontecer no fundo da medula óssea – uma visão geralmente inacessível à observação direta em pacientes.

Os investigadores descobriram que os espaços atingidos particularmente pela leucemia eram regiões especiais de vasos sanguíneos onde as células estaminais do sangue residem. Estas são as células sanguíneas básicas que podem tornar-se noutros tipos de células sanguíneas, gerando biliões de novas células todos os dias durante a vida.

Por esta razão, estas regiões especiais de vasos sanguíneos são vitais para a produção de sangue saudável e sua destruição por leucemia permite que a doença progrida. A perda destes vasos foi confirmada em seres humanos ao estudar amostras de tecido do paciente.

Para proteger os vasos sanguíneos, a equipa testou o medicamento deferoxamina. Um medicamento que é usado para tratar o excesso de ferro no sangue, o que pode acontecer, por exemplo, quando uma pessoa recebe múltiplas transfusões de sangue.

A deferoxamina também foi utilizada no tratamento da mielodisplasia, uma doença relacionada com a leucemia, em que as células estaminais jovens do sangue não amadurecem em células sanguíneas saudáveis. Os investigadores mostraram que este medicamento aumenta os vasos da medula óssea em ratos idosos.

A equipa de Cristina Lo Celso descobriu que o medicamento tinha um efeito protetor sobre os vasos sanguíneos na LMA, permitindo o resgate de células estaminais saudáveis ​​do sangue, melhorando os vasos sanguíneos e assim a eficiência da quimioterapia.

Delfim Duarte, médico do IPO-Porto, doutorado pela Faculdade de Medicina da Universidade do Porto e primeiro autor do estudo agora publicado, referiu: “O nosso trabalho sugere que as terapias que visam os vasos sanguíneos podem melhorar os regimes terapêuticos existentes para LMA e talvez para outras leucemias.”