Gosto pela música depende da vivência cultural e não da biologia

Sensibilidade musical é de origem cultural e não assenta em qualquer caraterística biológica ligada ao cérebro. O estudo é do MIT e da Universidade de Brandeis.

Gosto pela música depende da vivência cultural e não da biologia
Gosto pela música depende da vivência cultural e não da biologia. Foto: Alan Schultz, MIT

Nos estilos musicais ocidentais, do clássico ao pop, algumas combinações de notas são geralmente consideradas mais agradáveis que outras. Para a maioria dos nossos ouvidos, um acorde de C e G, por exemplo, soa muito mais agradável do que um acorde de C e F#.

Até agora, neurocientistas têm vindo a considerar que a preferência por determinados acordes estaria, de alguma forma, ligada aos nossos cérebros. Outros neurocientistas têm tomado uma posição diferente, considerando que as preferências sobre os acordes são culturalmente determinadas.

O debate tem sido difícil dada a dificuldade de desenvolver estudos com suporte científico. Esta dificuldade resulta, em grande parte, por haver muito poucas pessoas no mundo que não estejam familiarizadas com a música ocidental e com acordes ‘consonantes’.

Mas um novo estudo do Massachusetts Institute of Technology (MIT) e da Universidade de Brandeis, ambos nos EUA, e publicado na revista científica Nature, vem agora mostrar que as sensibilidades musicais ocidentais não são uma característica do sistema auditivo humano, mas dependem do ambiente cultural.

O estudo envolveu mais de 100 pessoas pertencentes a uma tribo remota amazónica, os tsimane, uma sociedade agricultura com cerca de 12000 pessoas, e com pouca ou nenhuma exposição à música ocidental. Nestas pessoas os investigadores verificaram que os acordes ‘dissonantes’, como a combinação de C e F#, foram classificadas apenas como agradáveis da mesma forma que os acordes ‘consonantes’.

Em 2010, Ricardo Godoy, antropólogo da Universidade de Brandeis, estudou os tsimane, e em conjunto com Josh McDermott, Neurocientista do Departamento de Cérebro e Ciências Cognitivas do MIT, verificaram que os tsimane reagiam à música.

Os investigadores procederam a dois estudos, um em 2011, e o outro em 2015. Em cada estudo, os investigadores pediram aos participantes para quantificarem o gosto por acordes ‘dissonantes’ e ‘consonantes’. Os investigadores também realizaram experiências para se certificarem de que os participantes conheciam a diferença entre sons ‘dissonantes’ e ‘consonantes’.

Os investigadores indicam que “realizaram os mesmos testes com um grupo de bolivianos de língua espanhola que vive numa pequena cidade perto da tribo Tsimane, e com moradores da capital boliviana, La Paz, e ainda com grupos de músicos e não músicos americanos”.

Nos estudos os investigadores verificaram que “a preferência pela ‘consonância’ sobre a ‘dissonância’ variou drasticamente nos cinco grupos”, referiu McDermott. “Na tribo Tsimane é indetetável, e nos dois grupos na Bolívia, há uma preferência estatisticamente significativa, mas pequena. Nos grupos americanos é um pouco maior, e é maior nos músicos do que nos não músicos”.

Assim, os investigadores concluíram que “a preferência para ‘consonância’ sobre a ‘dissonância’ depende da exposição à cultura musical ocidental, e que a preferência não é inata”, referiu Josh McDermott.