Uma molécula desenvolvida em laboratório e extensivamente estudada por cientistas do Instituto de Investigação Biomédica Fralin, da Virginia Tech, pode representar um avanço na redução da recorrência do glioblastoma, uma forma agressiva e mortal de cancro no cérebro.
Em estudo já publicado na Cell Death and Disease, os investigadores indicam que identificaram uma característica, até então desconhecida, das células cancerígenas que se mostra promissora para intervenção terapêutica. Os investigadores delinearam o mecanismo de ação e a eficácia do medicamento experimental, conhecido como JM2, que revelou potencial como terapia peptídica para atingir células cancerígenas que podem renovar-se e crescer novamente, mesmo após quimioterapia e radiação.
O glioblastoma, a forma mais comum de tumor cerebral maligno, é particularmente difícil de tratar. A sobrevida média após o diagnóstico é de pouco mais de 14 meses.
O tratamento geralmente envolve a remoção por cirurgia da maior parte possível do tumor, seguida de radioterapia e quimioterapia com um medicamento designado temozolomida. No entanto, o glioblastoma recorre sempre devido à presença de células-tronco de glioblastoma resistentes ao tratamento. Essas células cancerígenas podem sobreviver, mesmo após terapias convencionais, levando ao recrescimento do tumor.
“As células-tronco do glioblastoma podem se adaptar facilmente tanto ao ambiente quanto ao tratamento”, disse Samy Lamouille, autor correspondente do estudo e professor assistente do Instituto de Investigação Biomédica Fralin.
O investigador acrescentou: “Essas células podem permanecer dormentes e, em algum momento, despertar e reconstruir o tumor. É fundamental encontrar uma maneira de atingir essa população de células cancerígenas.”
A equipa de Samy Lamouille estuda como as células cancerígenas se comunicam entre si e com o ambiente ao redor, com foco especial na conexina 43. Esta proteína desempenha um papel fundamental na formação de junções comunicantes, que permitem a comunicação direta entre células, pelo que referiu Samy Lamouille, “A conexina 43 desempenha um papel complexo no câncer”, e “dependendo da sua expressão e localização nas células cancerígenas, ela pode tanto suprimir quanto promover o crescimento do cancro.”
O investigador para experimentar com células-tronco de glioblastoma cultivadas em laboratório, recorreu à microscopia de super-resolução, uma técnica poderosa que permite aos investigadores visualizar e localizar proteínas em nanoescala.
E, em conjunto com o professor associado James Smyth, especialista na técnica do estudo de junções comunicantes e proteínas conexinas em doenças cardíacas, descobriram, pela primeira vez, que a conexina 43 está fortemente associada aos microtúbulos dessas células, decorando-os ao longo de todo o seu comprimento.
Com base na descoberta, Lamouille usou JM2, um peptídeo derivado da conexina 43 que imita o domínio de interação dos microtúbulos da conexina 43, desenvolvido pelo investigador Rob Gourdie, para explorar melhor o papel nas células-tronco do glioblastoma.
“Quando testamos o JM2 em células-tronco semelhantes a glioblastoma, esse foi o momento mais emocionante”, disse Lamouille. “Isso não só interrompeu eficientemente a interação da conexina 43 com os microtúbulos, como o JM2 também foi tóxico especificamente para essas células, deixando as células cerebrais saudáveis ilesas.”
Como indica o estudo o efeito foi alcançado sem afetar outras funções cruciais da conexina 43.
Além do glioblastoma, o trabalho representa um passo significativo para a identificação de uma nova função tumorigénica para a conexina 43.
“Lembro-me de apresentações da equipe nas quais as glioesferas tridimensionais usadas para modelar tumores na placa de cultura estavam claramente ficando menores”, disse o coautor Gourdie, e acrescentou: “Foi surpreendente ver um efeito tão drástico no glioblastoma. O peptídeo JM2 teve um efeito letal por si só. Isso foi inesperado.”
Através de testes adicionais em culturas de células e organismos vivos, os investigadores descobriram que o JM2 interrompe a manutenção das células cancerígenas resistentes ao tratamento em experiência de laboratório e retarda significativamente o crescimento tumoral em modelos animais. Estas descobertas reforçam o JM2 como um novo fármaco promissor à base de peptídeos para atingir as células-tronco do glioblastoma, responsáveis pela recorrência do tumor após o tratamento.