Propagação do novo coronavírus no ambiente está a intrigar cientistas

Cientistas têm pouco conhecimento de como o novo coronavírus se propaga no ambiente e estão a estudar a transferência entre a pele e outros materiais, e o efeito da radiação UV e da luz solar nos coronavírus e a propagação pelas águas residuais.

Propagação do novo coronavírus no ambiente está a intrigar cientistas
Propagação do novo coronavírus no ambiente está a intrigar cientistas. Foto: NIAID-RML

Sabe-se ainda muito pouco como o SARS-CoV-2, o coronavírus que causa a COVID-19, se propaga no ambiente. Os cientistas indicam que os comportamentos e as características dos vírus são altamente variáveis, alguns espalham-se mais facilmente pela água, outros pelo ar. Alguns são revestidos por camadas de moléculas gordurosas que os ajudam a evitar o sistema imunológico dos hospedeiros, enquanto outros estão “despidos”.

Em presença da pandemia pelo novo coronavírus, é urgente que engenheiros e cientistas colaborem na identificação das características virais e ambientais que afetam a transmissão pelas superfícies, pelo ar e pela matéria fecal, indicam as investigadoras Alexandria Boehm, da Universidade de Stanford, e Krista Wigginton, da Universidade de Michigan.

As investigadoras são coautoras de um artigo publicado na Environmental Science & Technology, onde consideram fundamental uma abordagem mais ampla, de longo prazo e mais quantitativa para entender como os vírus, incluído o SARS-CoV-2, se propagam no ambiente.

Alexandria Boehm e Krista Wigginton são as principais investigadoras num projeto financiado pela National Science Foundation para estudar a transferência de coronavírus entre a pele e outros materiais, o efeito da radiação UV e da luz solar nos coronavírus e a conexão entre surtos de doenças e concentrações de vírus em águas residuais.

Cientistas e médicos especialistas não entendem quais as características e os fatores ambientais do vírus que controlam a persistência do vírus no ambiente, por exemplo, em aerossóis e gotículas, em superfícies como a pele e água, incluindo a água do mar.

Alexandria Boehm referiu: “Quando um novo vírus surge e representa um risco para a saúde humana, não temos uma forma para prever como é que ele se comportará no ambiente”.

Para as investigadoras, a falta de conhecimento deve-se a que historicamente os Institutos Nacionais de Saúde não financiam trabalhos sobre patógenos no meio ambiente, e o financiamento da National Science Foundation para este trabalho é limitado. Além disso, os coronavírus e a maioria dos vírus emergentes que chamaram a atenção do mundo, na última década, são vírus envoltos numa camada externa de moléculas lipídicas gordurosas que roubaram dos hospedeiros. As proteínas que envolvem os vírus podem ajudá-los a escapar ao sistema imunológico dos organismos que infetam.

“Tem havido muito mais trabalho sobre vírus não envelopados ou “despidos”, porque a maioria dos patógenos intestinais nos excrementos são vírus não envelopados – como os norovírus e rotavírus”, referiu Krista Wigginton.

As investigadoras abordaram as ameaças potenciais que vírus como o SARS-CoV-2 representam para as fontes de água, e referiram: “Normalmente, apenas nos preocupamos com os vírus na água se eles são excretados pelos seres humanos nas fezes e na urina”, mas “a maioria dos vírus em invólucro não é excretada nas fezes ou na urina e por isso geralmente não fazemos uma ligação que os vírus não envelopados e as fontes de água”.

“Há evidências crescentes de que os vírus SARS-CoV-2, ou pelo menos os seus genomas, são excretados nas fezes. Se vírus infeciosos são excretados, a exposição fecal pode ser uma via de transmissão”, referiu Alexandria Boehm, e acrescentou: “É improvável que essa seja uma importante via de transmissão, mas uma pessoa pode ser exposta interagindo com água contaminada com matéria fecal não tratada”.

Os sistemas de tratamento de água potável têm inúmeras barreiras de tratamento para remover os vírus mais prevalentes e os mais difíceis de remover, de acordo com os engenheiros. Investigações sobre vírus semelhantes ao vírus SARS-CoV-2 sugerem que eles são suscetíveis a esses tratamentos. “Em termos de concentração e persistência dos vírus, esse não é o pior cenário”, referiu Krista Wigginton.

As cientistas indicam no artigo que tendemos a estudar vírus muito intensamente quando há um surto, mas os resultados de um vírus não são fáceis de extrapolar para outros vírus que surgem anos depois. Krista Wigginton referiu: “Se adotássemos uma abordagem mais ampla para estudar muitos tipos de vírus, poderíamos entender melhor as características que direcionam seu destino ambiental”.

As duas cientistas pedem a especialistas de várias áreas de conhecimento, incluindo medicina e engenharia, para trabalharem juntos para mais rapidamente chegarem a descobertas e formular estratégias que não são possíveis alcançar num trabalho não multidisciplinar.